“A felicidade se conquista aos poucos. Ela é adquirida por cada pedra tirada do caminho”. A frase foi dita há três anos por Alcides do Nascimento Lins, então com 19 anos. Na época, o rapaz que foi assassinado na madrugada deste sábado, no Recife, fez história ao conquistar o primeiro lugar entre os feras da rede pública no Vestibular da Universidade Federal de Pernambuco.
E não só isto. A história de Alcides havia sido de superação, a partir da mãe do jovem, dona Luíza Ferreira do Nascimento, 44 anos,, que sustentou os filhos trabalhando suado como carroceira. A história foi contada em rede nacional pela TV Globo numa reportagem sobre felicidade no programa Fantástico.
A escolha da Alcides e dona Maria Luíza não foi à toa. Reportagem do Jornal do Commercio de maio de 2007 sobre mães guerreiras, assinada pela repórter Verônica Almeida, conta a luta de Dona Maria Luíza. Ouça aqui entrevista [em pop up] dada pela mãe de Alcides logo após o filho entrar no curso de Biomedicina da Universidade Federal de Pernambuco.
"O primogênito faleceu aos 7 meses, de infecção intestinal, o segundo antes mesmo de nascer e o terceiro, depois de um ano, vítima de meningite. Naquela época, dona Maria Luíza, que era obrigada a trabalhar fora para ajudar o marido flanelinha, deixava as crianças com os vizinhos. Mas depois das perdas sucessivas, mudou a rotina quando veio a quarta gestação. Nasceu Alcides e sua aparência frágil exigiu cuidados maternos intensivos. O garoto tinha asma e precisou de internações longas. Quando melhorou, Luíza passou a carregá-lo consigo nas faxinas que fazia para sustentar a casa. Depois nasceram Ana Paula e as gêmeas Andréa e Andreza.
Separada do marido e com poucas oportunidades, Luíza se abraçou a uma carroça de espetinhos. Acordava todos os dias às 4h na casinha de dois cômodos, concedida pela prefeitura na Vila Santa Luzia, na Torre, e seguia rumo ao Mercado do Cordeiro. Na semana da Festa de Nossa Senhora da Conceição, transferia-se para o morro, na Zona Norte da cidade, e lá trabalhava 24 horas, dia após dia, para garantir o café, o almoço e o jantar da família. Todo o esforço solitário tinha um objetivo: assegurar a vida e os estudos das crianças. “Meus filhos tinham que estudar. Nunca quis que nada fizessem. Precisam ter futuro diferente do meu”, diz.
Assim como Luíza, sua mãe teve que trabalhar duro para sustentar os filhos, mas morreu cedo. Órfã aos 9 anos, a menina franzina iniciou sua carreira profissional. “Carregava os fretes na feira, com um balaio na cabeça”, relembra. Passava a maior parte do dia na rua, trabalhando e quando caía a noite ainda tinha disposição para ir à escola, estudar. Depois casou e assumiu a batalha de dona de casa. Luíza poupou os filhos da mesma obrigação. Estudar é a palavra de ordem da mãe e eles obedecem. Não faltam às aulas na escola (o Caic da Torre e a Escola Martins Júnior) e não gostam de brincar na rua. Sempre preferem se deter aos livros. Alcides, que passou no vestibular deste ano, vive enfiado na biblioteca pública.
Com a divulgação da sua história, descoberta a partir do desempenho do filho (Alcides foi o primeiro lugar da rede pública, passou para biomedicina na UFPE), Luíza ganhou novo emprego. Trabalha agora como zeladora de uma creche da prefeitura, mas os desafios permanecem. Está devendo no açougue e na mercearia, tem a reforma da pequena casa para concluir e ainda virão as despesas de Alcides, que nos próximos meses começará a faculdade, aumentando os gastos com transporte e alimentação. “Ela é batalhadora, independente”, orgulha-se Andréa, 14 anos que, freqüenta a escola na companhia das irmãs e da mãe. “Não tive as oportunidades que as mães pobres de hoje têm, com os programas do governo. E mesmo assim mantive meus filhos na escola. Elas precisam fazer o mesmo”, ensina Luíza."
Fonte: JC Online.
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